TEXTO 05 –
DOSSIÊ DE HISTÓRIA - 22 de maio de 2016.
“A
História vai se lembrar”
Ela não
nos deixará esquecer que todo o barulho para mudar tudo foi, no fundo, um
movimento para que tudo continuasse igual. (por Aline Valek). Texto publicado na
revisa Carta Capital.
Vou me lembrar dos risos e fogos enquanto as coisas
ruíam. O riso de quem só queria estar certo, não importando quão feio tivesse
que ser o rasgo, ou quanta lambança precisasse ser feita apenas para que
pudesse dizer “chupa” ou “bem feito” para o outro lado.
Vou me lembrar da TV criando seu próprio roteiro e
das pessoas acreditando nele, como se fosse novela, como se fosse propaganda –
em vez de celebridade, foi âncora de jornal vendendo o produto em questão.
Vou me lembrar da sinfonia de panelas orquestradas
para dar força aos planos de alguns poucos, sob o disfarce de indignação geral.
As mesmas panelas que calaram quando eram adolescentes apanhando da polícia, ou
a periferia sendo massacrada, ou a merenda sendo roubada.
Vou me lembrar de quem pediu pelos militares, vou
me lembrar de quem aplaudiu torturador, vou me lembrar dos rostos de quem
agrediu e cuspiu em pessoas que deram o azar de estar com a camisa da cor
errada.
Vou me lembrar dos votos de deputados sendo, sem
nenhuma vergonha, endereçados aos seus parentes, esposas, filhos, como se
dissessem “é por mim mesmo que estou fazendo isso”; mas tudo bem, todos os
pecados serão perdoados, desde que praticados por alguém que defenda a sigla
certa.
Vou me lembrar de um substituto que não poupou
esforços, cartinhas vazadas e articulações nos bastidores para ascender ao
poder sem votos. Vou me lembrar do cheiro de pizza voltando com força, das
investigações voltando para a gaveta e das mulheres voltando para o seu lugar,
não no poder, mas na beleza, no recato e no lar.
Vou me lembrar de que todo o barulho e toda a
confusão para que se mudasse tudo foi, no fundo, movimento para que continuasse
tudo igual.
Vou me lembrar porque a memória deles é fraca, mas meu
nome é História. Hoje me negam, amanhã me repito. Já aconteceu antes. E, do
jeito que continuam a me amassar, me jogar para debaixo do tapete, a se recusar
a olhar na minha cara, vou acontecer de novo. E nem adianta me dar tchau.
(Aline
Valek).
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Respeito é palavra prática.