O rei dos
animais
O homo sapiens só se tornou o rei dos
animais quando começou a desenvolver sua capacidade de abstração. Até então,
não tinha vantagens sobre outros humanos, como os Neandertais. Yuval Harari,
historiador israelense, assinala que a chamada Revolução Cognitiva teria
ocorrido entre 40 mil e 70 mil anos atrás. Se considerarmos que os humanos já
povoavam o planeta há pelo menos 200 mil anos, pode-se concluir que foi uma conquista
lenta e árdua. Conquista, por outro lado, alcançada quando ainda éramos
caçadores-coletores, mais coletores do que caçadores, na verdade.
Apesar do prestígio que o abate de
um animal grande trazia aos machos da tribo, a maior parte dos alimentos necessários
à sobrevivência da tribo era obtida de raízes, frotas, pequenos animais e até
insetos. Pesquisadores observam que a grande vantagem da dieta desse período
consistia na variedade alimentar que supria todas as necessidades nutricionais
dos nossos avós.
Já na agricultura, que com frequência
consistia em uma monocultura (arroz, trigo, milho, batata, ou outro
carboidrato, geralmente), havia carências importantes para nosso organismo de
onívoros. É verdade que a agricultura, que começou há uns 12 mil anos, pode ter
criado gente mais chata, mais rotineira, sem horizontes tão amplos quanto os
dos caçadores-coletores (vistos por alguns especialistas com uma aura
romântica, como se fossem aventureiros por livre escolha). É uma visão
distorcida.
Pequenos e frágeis bandos de algumas
dezenas de membros tinham de disputar comida com competidores bem maios
aparelhados de garras, mandíbulas e músculos. A grande vantagem que tinham era
fruto da revolução cognitiva que permitiria intercambio entre bandos, troca de
experiências, de produtos, e mais importante do que tudo, de linguagem. Não que
a linguagem já não existisse.
Humanos de todas as espécies se
comunicavam. Não só os humanos, na verdade, hoje sabemos que baleias e
golfinhos se comunicam, que cães e gatos se comunicavam, que formigas e abelhas
se comunicavam. Mas se trata de uma comunicação básica do tipo: “cardume de sardinha,
ou açúcar no armário”. É impossível imaginar uma foca dizendo a outra que tal homenagearmos
nossa avó morta fazendo uma escultura naquele bloco de gelo? Ou uma abelha
pregando uma rebelião: ¨Vamos atacar aquele agrônomo que vai envenenar os
pomares?¨.
A capacidade de pensar
abstratamente, com coesão e coerência, é uma característica não apenas humana,
mas de uma espécie específica de humanos, o homo sapiens. Ela surge, não se
sabe ainda porque, nem exatamente quando, (entre 40 mil e 70 mil anos é um
prazo bem elástico), e tem várias consequências. A primeira foi a de acabar com
a concorrência. Mais articulados, mais capazes de trabalhar em grupos maiores,
os sapiens se impõe, sobre os outros e se tornam os únicos humanos a habitar o
planeta. Vestígios de DNA, de Neandertais encontrados em populações europeias e
do médio oriente nos que, em alguns lugares, deve ter ocorrido um cruzamento
entre as espécies, mas em outras nós prevalecemos, por bem ou por mal.
Em alguns vales (na Índia, na China,
no Egito, na Mesopotâmia, por exemplo), fomos nos estabelecendo, criando nossas
famílias com mais segurança, plantando os produtos mais adequados a cada
condição geoclimática, construindo casas, levantando cercas, inventando deuses
para nos proteger de outros humanos e adotando cães para nos alertar contra animais
perigosos. Onde havia abundancia, deixamos outras famílias se juntarem às
nossas, e fomos estabelecendo regras de conduta e formas de adoração daqueles
deuses que havíamos inventado.
Tratamos de transmitir aos nossos descendentes
não apenas nossas práticas agrícolas, nossas técnicas de construção, ou nossa
forma de preparar alimentos e estocá-los para dias de carência, mas também
ensinamos nossa língua, ou seja, o nome das coisas concretas e das coisas
abstratas, do mundo real e do mundo da imaginação. Essa capacidade, que mais
tarde transmitiríamos pela palavra escrita, principalmente por meio de livros,
corre o risco de se perder. Não para todos, já que sempre haverá uma parte
capaz de criar e transmitir conceitos, ideias, imagens. Mas, não para aqueles
que se satisfazem apenas em digitar e ler tolices, retroagindo dezenas de
milhares de anos. Não adianta que o façam em aparelhos modernos, como se a
mídia sozinha fosse a mensagem. Não é.
Autor: Jaime Pinsky - Historiador
e editor, professor titular da Unicamp e escritor – publicado no Correio
Braziliense – 05março2017 – pág. 11 (opinião).
ATIVIDADES.
1. Pesquise o
significado das palavras e/ou conceitos abaixo:
1.
Conceito
2.
Homo
Sapiens.
3.
Abstração.
4.
Cognição.
5.
Monocultura.
6.
Carboidrato.
7.
Coesão.
8.
Neandertais.
9.
Geoclimática.
10. Pré-história.
2. Responda, conforme as
informações do texto.
·
O que levou os Sapiens a prevalecer
sobre as outras espécies?
·
Quando
e porque nos tornamos reis dos animais?
·
Como
era nossa alimentação?
·
Descreva
os Sapiens, no início da evolução.
· Quando,
segundo o texto, os sapiens adquirem a capacidade de abstração, o que é essa
capacidade e quais suas consequências?
·
Para
o autor, o que significa língua?
·
Em
quais lugares o sapiens, inicialmente se estabeleceu e como se comportavam?
·
Segundo
o texto, o que transmitimos para nossos descendentes?
·
Porque
essa capacidade de transmitir conhecimentos corre o risco de se perder?
Faça
uma pequena biografia das personagens abaixo:
Zezé
Motta – Joel Zito – Chiquinha Gonzaga – Grande Otelo – Pixinguinha – Zumbi de
Palmares – Josué de Castro – Pelé – Antonio Olimpio Santana – Solano Trindade.
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