DOSSIÊ DE HISTÓRIA
– TEXTO (04) QUATRO – 2ºs e 3ºs ANOS. – 12setembro2017
Afinal, por que
é que o Brasil nunca deixa de ser pobre?
·
Spoiler:
porque o único caminho para enriquecer é diluir a concentração de poder
político-econômico. E o que fazemos é justamente o contrário.
·
Por
Felippe Hermes – texto publicado na revista Superinteressante nº 378 – Agosto 2017.
Mais de 40 milhões de
brasileiros moram em residências sem acesso a água potável, mesmo estando no país
com as maiores reservas de água doce do mundo. Em um terço dos 1.444 municípios
do semiárido nordestino, mais de 10 % das crianças sofre de desnutrição no país
que mais produz proteína animal no planeta.
Mergulhando um pouco mais na história brasileira, não
é difícil perceber que riquezas naturais
e qualidade de vida para a população não são necessariamente coisas que
andam lado a lado. Nosso imenso potencial tem feito justamente o contrário, nos
ajudando a empacar em uma nada agradável 80ª posição mundial quando o assunto é
a riqueza produzida por cada cidadão. Não faz sentido.
Lendo a próxima página, no entanto, você vai entender
os porquês.
Primeiro, vamos rebobinar a fita da história até o
século 17. Na época, o Brasil e as
colônias britânicas que viriam a formar os Estados Unidos já representavam
polos antagônicos na economia mundial, mas na posição inversa da de hoje.
Por aqui, produzíamos a
maior riqueza conhecida na época, a cana de açúcar, que foi capaz de tornar
Recife uma das cidades mais ricas do mundo. Nas colônias da América do Norte não
havia um clima próprio para a cana. A solução,
então, foi improvisar. Primeiro, elas se tornaram um grande fornecedor de
alimentos e animais de tração para as ilhas caribenhas que disputavam a
produção de cana com o Brasil – já que nessas ilhas todo o território se
destinava á produção de açúcar.
Ai que as coisas começaram a se desenhar. Enquanto nós
e os caribenhos caímos de cabeça na monocultura de cana, a América do Norte
usava o ouro que recebia das Antilhas para criar variedade na agricultura, na
pecuária e na pesca. Tudo num círculo virtuoso capaz não só de distribuir
melhor a riqueza, como de criar mais riqueza. Da necessidade cada vez maior de
barcos de pesca, por exemplo, surgiu uma indústria naval que logo passaria a
vender embarcações para as potências europeias.
No Brasil, acontecia justamente o contrário. A cana enriquecia
meia dúzia de senhores de engenho, e essa renda permanecia concentrada. Acabava
reinvestida em mais monocultura. E seguimos assim até o século XX. Agora o café
era a nova cana. Fora isso, pouco havia mudado.
A concentração de renda na
economia fomentou a concentração de poder na política. Nisso a república
brasileira consolidou-se como uma sociedade extrativista, na qual esse pequeno
grupo se alimentava do poder político para manter inabalado seu poder
econômico, dificultando qualquer forma de inovação ou de empreendedorismo.
Lá fora, por ouro lado, a diversificação
dos negócios diluiu tanto o poder econômico como o político, e a inovação
ganhou um papel relevante. “Inovação”, aliás, já virou uma palavra vazia, de
tão mal usada. Então vamos aqui para um exemplo clássico. No Brasil,
construímos nossas ferrovias com o intuito de escoar o café. Nos EUA, a malha ferroviária
desenvolveu-se para transportar a produção de alimentos. Num segundo, para
escoar petróleo, popularizado por John D. Rockfeller na segunda metade do
século 19 (ainda como fonte de energia para lâmpadas de querosene, não para
carros). E veio uma inovação de fato: tendo de pagar cada vez mais aos donos
das ferrovias, John D. decidiu construir oleodutos. Aos donos das ferrovias,
coube buscar novos clientes. E aí aconteceu uma inovação ainda mais importante.
As ferrovias acabaram
fomentando o comércio à distância, que também estava nascendo no final do
século19. Resultado: cem anos atrás, um americano típico já conseguia mobiliar
a casa toda comprando produtos por catálogos, mesmo que morasse em uma cidade
afastada. Numa cajadada só, isso bombou a demanda e a oferta de todo tipo de
produto. Ou seja: ao mesmo tempo em que atiçava o comércio, isso diluía ainda
mais o poder econômico – e, com ele, o poder político.
Como virar o jogo?
Para que a economia cresça
você precisa unir trabalho (população), capital (máquinas, terras,
equipamentos) e tecnologia (educação). A concentração de poder econômico e
político joga contra os dois últimos fatores. É que ela gera aquilo que o
pessoal da economia chama de “instituições extrativistas”. Estamos falando em
leis escritas por quem se beneficia dessas mesmas leis, em governos que, via impostos,
fazem com que os pobres banquem privilégios dos ricos, em uma educação que sói atende
um pequeno grupo de privilegiados.
Tais instituições aniquilam a
educação e dão um tiro de cara bina empreendedorismo. Ou seja: o capital
continua fixo nas mãos da meia dúzia de sempre, além de perdermos a capacidade
de produzir tecnologia.
Na prática, isso explica por
que um americano médio produz quatro vezes mais riqueza que um brasileiro, ou
por que alcançaremos apenas em 2026 a mesma produtividade que cada cidadão
americano tinha no início da década de 1960.
Pudera. Em termos
proporcionais ao PIB, investimos três vezes menos em educação básica do que a média
dos países ricos, ao mesmo tempo em que gastamos mais do que a média em ensino
superior. Na prática, seis em cada dez alunos que entram hoje, na USP estão
entre os 20% mais ricos da população.
Ainda que de maneira
invisível, fomentamos a manutenção da desigualdade e o extrativismo de renda de
formas que vão bem além do furto que você sofre todos os dia soa pagar impostos
para financiar Joesley Batista e cia.
Vendedores de matéria-prima.
Tudo isso ajuda a explicar
por que os grandes produtos de exportação do Brasil sejam soja, minério de
ferro, petróleo cru, carne, café e açúcar, enquanto os dos EUA são aviões,
medicamentos, circuitos integrados. Ainda que não nos consideremos mais um país
agrário, mantemos instituições idênticas ás dos nossos tempos de colônia, moldadas
para perpetuar problemas. Enquanto a nossa educação for uma piada; nossos impostos,
uma forma de transferir renda dos pobres para os ricos, e boa arte dos nossos políticos,
meros capachos de grandes empresas, não vai ter ouro jeito: seguiremos na
mesma, como um país desigual que vive para exportar matéria-prima. Vai um caldo
de cana?
Questões do texto:
1. Quantas e quais as
colônias britânicas na América do Norte e que formaram os Estados Unidos?
2. Como os EUA, o Brasil e
as Antilhas, aproveitaram a riqueza gerada pelo comércio?
3. O que você entendeu como “círculo
virtuoso”?
4. Como foi distribuída, no Brasil,
a riqueza gerada pela cana de açúcar?
5. Como a república
brasileira se consolidou, em oposição à república dos EUA (lá fora, no texto)?
6. Segundo o texto, para que
Brasil e EUA construíram ferrovias?
7. Qual a consequência das
ferrovias nos EUA?
8. Segundo o texto, qual a
fórmula para virar o jogo econômico no Brasil?
8. Quem banca os privilégios
dos ricos no Brasil e como acontece, segundo o texto?
9. O que o Brasil exporta? E
os EUA, segundo o texto?
10. No texto, quem nasce nos
EUA é chamado de “americano”. Você concorda ou discorda? E por quê?
11. Como a educação é
tratada pelas elites brasileiras, segundo o texto?
12. Pesquise os sinônimos e
conceitos que, para você são desconhecidos e que estão no texto.
13. Faça as biografias das
personalidades a seguir: Frei Leonardo Boff – Milton Santos, geógrafo
brasileiro – Frei Betto – Dom Paulo Evaristo Arns – Santo Agostinho – São Thomaz
de Aquino – Aristóteles – Antônio Gramsci.
14. O que é Spoiler? E Meme? Para que serve
um Meme?
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