O rei dos
animais
Jaime Pinsky
- Historiador e editor, professor titular da Unicamp e escritor – publicado no
Correio Braziliense – 05março2017 – pág. 11 (opinião).
O homo sapiens só se tornou o
rei dos animais quando começou a desenvolver sua capacidade de abstração. Até
então, não tinha vantagens sobre outros humanos, como os Neandertais. Yuval
Harari, historiador israelense, assinala que a chamada Revolução Cognitiva
teria ocorrido entre 40 mil e 70 mil anos atrás. Se considerarmos que os
humanos já povoavam o planeta há pelo menos 200 mil anos, pode-se concluir que
foi uma conquista lenta e árdua. Conquista, por outro lado, alcançada quando
ainda éramos caçador-coletores, mais coletores do que caçadores, na verdade.
Apesar do prestígio que o abate de um animal grande trazia aos machos da tribo,
a maior parte dos alimentos necessários à sobrevivência da tribo era obtida de
raízes, frotas, pequenos animais e até insetos. Pesquisadores observam que a
grande vantagem da dieta desse período consistia na variedade alimentar que
supria todas as necessidades nutricionais dos nossos avós.
Já na agricultura, que com frequência consistia em uma monocultura (arroz,
trigo, milho, batata, ou outro carboidrato, geralmente), havia carências
importantes para nosso organismo de onívoros. É verdade que a agricultura, que
começou há uns 12 mil anos, pode ter criado gente mais chata, mais rotineira,
sem horizontes tão amplos quanto os dos caçadores-coletores (vistos por alguns
especialistas com uma aura romântica, como se fossem aventureiros por livre
escolha). É uma visão distorcida.
Pequenos e frágeis bandos de algumas dezenas de membros tinham de disputar
comida com competidores bem maios aparelhados de garras, mandíbulas e músculos.
A grande vantagem que tinham era fruto da revolução cognitiva que permitiria
intercambio entre bandos, troca de experiências, de produtos, e mais importante
do que tudo, de linguagem. Não que a linguagem já não existisse.
Humanos de todas as espécies se comunicavam. Não só os humanos, na verdade,
hoje sabemos que baleias e golfinhos se comunicam que cães e gatos se comunicavam
que formigas e abelhas se comunicavam. Mas se trata de uma comunicação básica
do tipo: “cardume de sardinha, ou açúcar no armário”. É impossível imaginar uma
foca dizendo a outra que tal homenagearmos nossa avó morta fazendo uma
escultura naquele bloco de gelo? Ou uma abelha pregando uma rebelião: ¨Vamos
atacar aquele agrônomo que vai envenenar os pomares?¨.
A capacidade de pensar abstratamente, com coesão e coerência, é uma
característica não apenas humana, mas de uma espécie específica de humanos, o
homo sapiens. Ela surge não se sabe ainda porque, nem exatamente quando, (entre
40 mil e 70 mil anos é um prazo bem elástico), e tem várias consequências. A
primeira foi a de acabar com a concorrência. Mais articulados, mais capazes de
trabalhar em grupos maiores, os sapiens se impõe, sobre os outros e se tornam
os únicos humanos a habitar o planeta. Vestígios de DNA, de Neandertais
encontrados em populações europeias e do médio oriente nos que, em alguns
lugares, deve ter ocorrido um cruzamento entre as espécies, mas em outras nós
prevalecemos, por bem ou por mal.
Em alguns vales (na Índia, na China, no Egito, na Mesopotâmia, por exemplo),
fomos nos estabelecendo, criando nossas famílias com mais segurança, plantando
os produtos mais adequados a cada condição geoclimática, construindo casas,
levantando cercas, inventando deuses para nos proteger de outros humanos e
adotando cães para nos alertar contra animais perigosos. Onde havia abundancia,
deixamos outras famílias se juntarem às nossas, e fomos estabelecendo regras de
conduta e formas de adoração daqueles deuses que havíamos inventado.
Tratamos de transmitir aos nossos descendentes não apenas nossas práticas
agrícolas, nossas técnicas de construção, ou nossa forma de preparar alimentos
e estocá-los para dias de carência, mas também ensinamos nossa língua, ou seja,
o nome das coisas concretas e das coisas abstratas, do mundo real e do mundo da
imaginação. Essa capacidade, que mais tarde transmitiríamos pela palavra
escrita, principalmente por meio de livros, corre o risco de se perder. Não
para todos, já que sempre haverá uma parte capaz de criar e transmitir
conceitos, ideias, imagens. Mas, não para aqueles que se satisfazem apenas em
digitar e ler tolices, retroagindo dezenas de milhares de anos. Não adianta que
o façam em aparelhos modernos, como se a mídia sozinha fosse a mensagem. Não é.
ATIVIDADES.
1. Pesquise
o significado das palavras e/ou conceitos abaixo:
1. Conceito
2. Homo
Sapiens.
3. Abstração.
4. Cognição.
5. Monocultura.
6. Carboidrato.
7. Coesão.
8. Neandertais.
9. Geoclimática.
10. Pré-história.
2.
Responda, conforme as informações do texto.
1. O que
levou os Sapiens a prevalecer sobre as outras espécies?
2. Quando
e porque nos tornamos reis dos animais?
3. Como
era nossa alimentação?
4. Descreva
os Sapiens, no início da evolução.
5. Quando,
segundo o texto, os sapiens adquirem a capacidade de abstração, o que é essa
capacidade e quais suas consequências?
6. Para
o autor, o que significa língua?
7. Em
quais lugares o sapiens, inicialmente se estabeleceu e como se comportavam?
8. Segundo
o texto, o que transmitimos para nossos descendentes?
9. Porque
essa capacidade de transmitir conhecimentos corre o risco de se perder?
3.
Faça uma pequena biografia das personagens abaixo:
1.Zezé
Motta – 2.Joel Zito – 3.Chiquinha Gonzaga – 4.Grande Otelo – 5.Pixinguinha – 6.Zumbi
de Palmares – 7.Josué de Castro – 8.Pelé – 9.Antônio Olímpio Santana – 10.Solano
Trindade – 11.Manuel de Barros – 12.Manuel Bonfim.
Comentários
Postar um comentário
Respeito é palavra prática.